quinta-feira, 9 de maio de 2013

Amarelas


Entrei pela porta da frente naquele dia.
Caminhei até a cozinha e me deparei com um pequeno vaso de flores em cima da mesinha. Flores amarelas.
"Não são para mim", pensei.
Saí da cozinha para deixar bolsa, sapato, chave e livro em algum canto do quarto. Voltei e lá estavam elas: amarelas. Flores amarelas.
Resolvi ligar.
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Ninguém atendeu.
Elas me encaravam como pequenos girassóis. Mas não eram. Se fossem girassóis, faria sentido. Girassóis são sempre amarelos. Exceto quando não são girassóis.
Aquelas ali eram miúdas. Bonitas, é verdade, mas pequenininhas. A-ma-re-li-nhas.
Eram tantas que pareciam se debruçar uma sobre a outra. Lutavam por espaço e atenção dentro daquele vasinho de plástico preto.
Enchi minha caneca com o café que estava na garrafa desde cedo.
Frio.
Abri a geladeira para pegar o açúcar.
Depois abri novamente para guardá-lo.
Abri ainda uma terceira vez, mas não peguei nada.
Virei meu corpo e encarei-as novamente.
Cheguei a pegar o vaso com a ideia de colocá-lo na varanda. Talvez precisassem de ar. E sol.
O vaso caiu então, e se distribuiu pelo chão, fazendo a terra e aquelas coisinhas amarelas se espalharem pelo mármore branco.
Quando voltei com o pano, notei que apenas algumas tinham caído, e estavam estranhamente distribuídas sobre aquela terra escura, quase preta.
"Bonito", pensei.
Coloquei o vaso no mesmo lugar onde encontrei. Elas pareciam menos espremidas agora. Pareciam maiores. Mas não eram. E continuavam amarelas. Eu não conseguia entender.
Talvez ele as estivesse comprado para filha de alguém. Ou outra mulher. Ou talvez tenha simplesmente errado a cor por ter comprado com pressa.
Ouvi a porte bater.
Abri a geladeira.
- Oi, amor.
- Oi.
Ele deixou as chaves em cima da mesa da cozinha. Sempre fazia isso.
- Viu as flores que eu comprei pra você?
- Pra mim?
- Ué, claro - ele mastigava uma maça enquanto falava.
Virei de costas e encarei-as de novo. E lá estavam: amarelinhas de um jeito irritantemente delicado.
- Por que amarelas?
Ele parou um instante e as observou.
- Não sei.
Ele saiu da cozinha sem dizer mais nada.
Até hoje eu não entendo.

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